Há exatos dez anos, uma imagem impactante fez o mundo parar: o corpo de Alan Kurdi, um menino sírio de apenas 3 anos, foi encontrado de bruços na areia de uma praia em Bodrum, na Turquia. O menino havia morrido afogado após o naufrágio do bote em que viajava com a família em busca de refúgio na Europa.
A tragédia que abalou o mundo
A história de Alan Kurdi não foi um caso isolado, mas sim um dos mais emblemáticos de uma crise migratória sem precedentes. Em 2015, mais de 1,3 milhão de pessoas chegaram à Europa fugindo de guerras e perseguições, especialmente da Síria, onde a guerra civil já durava há quatro anos. Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), cerca de 3.700 pessoas morreram tentando atravessar o Mediterrâneo naquele ano.
Além disso, a imagem registrada pela fotógrafa Nilüfer Demir, da Associated Press, tornou-se um símbolo global do sofrimento dos refugiados. A foto provocou comoção internacional e forçou líderes políticos a repensarem suas políticas migratórias. No entanto, apesar da comoção momentânea, os efeitos duradouros foram mais complexos.
Fuga da guerra e rotas perigosas
A família de Alan Kurdi vivia em campos de refugiados na Turquia desde o início do conflito sírio. Diante da saturação desses locais e da prolongada instabilidade em seu país, eles decidiram tentar a sorte na Europa. Inicialmente, buscaram asilo no Canadá, onde uma tia já residia, mas o pedido foi negado. Portanto, optaram pela rota mais comum: a travessia do Mediterrâneo em botes infláveis.
- Bodrum (Turquia) era o ponto de partida.
- Destino: a ilha grega de Kos, a poucas milhas de distância.
- A viagem, normalmente curta, se transformou em tragédia.
Na madrugada de 2 de setembro de 2015, o pequeno Alan, seu irmão Galip e a mãe, Rehan, embarcaram em um bote superlotado. Uma onda virou a embarcação. O pai, Abdullah Kurdi, tentou salvar a família, mas não conseguiu. Alan, Galip e Rehan morreram afogados.
Impacto político e social na Europa
A imagem de Alan Kurdi ecoou por toda a Europa e gerou uma onda de empatia momentânea. Governos prometeram ajudar, e a Alemanha, em especial, abriu as portas para centenas de milhares de refugiados. No entanto, com o tempo, o cenário mudou drasticamente.
Hoje, dez anos depois, a Europa enfrenta um cenário político dominado por discursos anti-imigração. Partidos de extrema direita cresceram significativamente, e a União Europeia ainda não conseguiu aprovar uma política migratória comum. Embora o número de chegadas tenha caído — cerca de 240 mil em 2024, segundo a Frontex —, as rotas migratórias se tornaram mais perigosas e complexas.
O legado da tragédia
O impacto da morte de Alan Kurdi foi imediato, mas não duradouro. Mesmo após a comoção internacional, a Europa não conseguiu criar uma resposta humanitária eficaz e duradoura. Pelo contrário, o discurso anti-refugiados se fortaleceu, influenciando eleições e políticas governamentais em diversos países.
O professor de Relações Internacionais João Carlos Jarochinski afirma que a falta de ação clara dos líderes europeus na época alimentou o crescimento de movimentos radicais. “Hoje há um predomínio de governos com perspectiva anti-imigração. O discurso se popularizou tanto que até a esquerda adota posturas semelhantes”, explica.
Portanto, embora a imagem de Alan Kurdi tenha mudado temporariamente a narrativa, a tragédia não resultou em mudanças estruturais duradouras. A Europa continua dividida sobre como lidar com o fluxo migratório, e o debate sobre refugiados permanece polarizado.
Conclusão: uma imagem que marcou história
Dez anos após a morte de Alan Kurdi, sua imagem ainda serve como um lembrete doloroso da fragilidade da vida e da falha coletiva da comunidade internacional em proteger os mais vulneráveis. A crise de 2015 foi um divisor de águas, mas a Europa ainda busca um caminho equilibrado entre humanidade e política. Em memória de Alan e de todos os que perderam suas vidas em busca de segurança, é preciso continuar questionando: o que aprendemos com aquela praia em Bodrum?